sexta-feira, 28 de agosto de 2009

A ARTE DE PERDOAR *

Em todos os caminhos do crescimento humano, tanto o psicológico quanto o espiritual, uma ênfase especial é dada à questão da mágoa.
Não só pelo sofrimento que ela em si, produz, mas também pelo transtorno que provoca nos relacionamentos.
Qualquer que seja o nome que damos a esse sentimento, seja mágoa, rancor, ressentimento ou vingança, ele se caracteriza pela amargura processada na alma, uma sensação de injustiça a partir do mal que alguém nos fez.
Além da dor, o componente fundamental da mágoa é a sua permanência. É uma incapacidade de se parar de sofrer, mesmo com o passar do tempo.
E como é impossível levar nossas vidas sem sermos machucados pelas outras pessoas de vez em quando e tendo em vista a imperfeição da natureza humana, corremos o risco de acumular feridas e nos tornarmos pessoas amargas, desiludidas e sofredoras.
A mágoa é uma forma de guardarmos para depois coisas que não queremos resolver na hora.
Uma das características da vida é que ela só pode ser vivida no presente.
O passado e o futuro, apesar de existirem na nossa cabeça, não têm existência real. Seria uma tolice imaginarmos poder respirar para o amanhã, poder viver o ontem.
O natural é que as coisas sejam vividas, mesmo as ruins, no momento em que elas ocorrem.O sentimento de raiva, que é natural, tem o objetivo de nos ajudar a resolver nossos problemas, incluindo as ofensas, traições ou quaisquer outros atos que as pessoas produzam. Quando somos inibidos na nossa raiva, quando temos medo de expressá-la, ela esfria dentro de cada um de nós e se transforma em mágoa.
A mágoa, então, é toda raiva que ficou para depois. É a raiva dentro da geladeira. É o medo de resolvermos nossos conflitos com outras pessoas no momento em que aparecem.
Guimarães Rosa define magistralmente a mágoa no seu livro Grande Sertão Veredas:"Mágoa é lamber frio o que o outro cozinhou quente demais para nós".
A pessoa rancorosa apresenta dificuldade em aceitar a imperfeição humana, idealizando uma realidade onde as pessoas nunca falhem com ela; expressando a raiva na colocação clara do seu desagrado diante do outro; vivendo o momento presente, mas sendo extremamente apegada ao passado.
Por isso, quem guarda mágoa, em geral, é também um saudosista e culposo, características dos que vivem no passado.
Uma vez, porém, instalada a mágoa, só nos resta uma saída: o perdão.
Se a mágoa nos envenena e machuca, o perdão nos alivia e cura.
Pode-se medir a sanidade psicológica de alguém por sua capacidade de perdoar. O perdão é a ponte que nos faz sair da depressão para a alegria:
"Perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos aqueles que nos têm ofendido”.
Por que tanta dificuldade em perdoar?
Porque há equívocos em torno do perdão que dificultam o exercício dele.
Primeiro por haver uma crença falsa de que o beneficiário do perdão é a pessoa que nos ofendeu...lêdo engano.
O perdão é algo bom para quem perdoa.
Perdoar é ficar livre da dor causada pelo outro.
É ficar livre daqueles que nos magoaram.
É um presente dado a si mesmo.
Em segundo lugar, há uma idéia igualmente falsa de que ao perdoarmos devemos esquecer o mal que nos fizeram, e voltar a ter com a pessoa o mesmo relacionamento de antes...
É importante salientar: Perdoar não é esquecer. É apenas parar de sofrer.
Devemos, porém, aprender com a experiência e podemos, a partir daí, escolher qual relacionamento teremos com o “ofensor”.
Perdoar não significa fazer de conta que nada aconteceu.
Ao contrário, temos de levar em conta a experiência, revendo a relação, e por isso mesmo, nos livrando da origem causal do sofrimento.
Certamente, perdoar os outros é o presente que oferecemos a nós mesmos.
Ao perdoar deixamos de carregar na alma tanto as ofensas quanto a memória daqueles que nos ofenderam.

* Fernando Palma Lima






O verdadeiro perdão se reconhece pelos atos e não pelas palavras.



Humberto Siqueira Cardeal

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